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Alma do Diabo

Alma do Diabo

Antoine de Saint-Exupéry. Antes do voo.

24.02.23

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“Porque, acima de tudo, são fúteis, as missões que nos exigem. E cada dia ainda mais fúteis. Mais sangrentas e mais fúteis. Os que dão ordens não têm outro recurso, para se oporem ao desmoronar da montanha, a não o de lançarem os últimos trunfos na mesa.

Dutertre e eu somos esses trunfos e ficamos a ouvir o Comandante, que nos explica o programa da tarde. Manda-nos sobrevoar, a setecentos metro de altitude, o parque de tanques da região de Arrás, no regresso de um longo percurso de dez mil metros, no mesmo tom de voz com que nos diria:

- Sigam então pela segunda rua à direita até à esquina da primeira praça; há aí uma tabacaria onde me podem comprar fósforos…

- Muito bem, meu Comandante.

A missão não é nem mais nem menos útil. A linguagem que a transmite não é nem mais nem menos lírica.

Digo para comigo: «missão de sacrifício». Penso… penso muitas coisas. Vou esperar pela noite, se ainda estiver vivo, para reflectir. Mas vivo… Quando uma missão é fácil, de três volta um. Quando é um pouco mais «complicada», claro que é mais difícil regressar. E aqui, no gabinete do comandante, a morte não me parece nem augusta, nem majestosa, nem heroica, nem dilacerante. É apenas um sinal de desordem. Um efeito da desordem. O Grupo vai perder-nos, tal como se perdem bagagens na barafunda das correspondências dos caminhos-de-ferro."

 

Saint-Exupéry, Antoine. Piloto de Guerra. Relógio d’Água Editores, 2015

 

Por. Celeste Sampaio