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Alma do Diabo

Alma do Diabo

Louis-Ferdinand Céline . Tempo e espaço

21.12.23

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“Alguns meses modificam um quarto, mesmo que não se mexa em nada do que ele tem dentro. Por velhas, por escavacadas que as coisas estejam, assim mesmo encontram, não se sabe onde, força para envelhecer. Tudo tinha mudado à nossa volta. Não os objectos de lugar, bem entendido, mas as próprias coisas em profundidade. São outras, as coisas, quando as reencontramos, dir-se-á que possuem força para se imprimir em nós mais tristemente, com profundidade ainda maior, com mais suavidade do que antes, para se diluirem nessa espécie de morte que lentamente, amavelmente dia após dia se vai fazendo em nós de forma cobarde, perante a qual nos vamos empenhando em defender-nos sempre menos do que na véspera. Vemo-la enternecer-se cada vez mais, vemos enrugarem-se dentro de nós a vida, os seres e com eles as coisas que tínhamos abandonado banais, preciosas, por vezes temíveis. O medo de acabarmos marcou tudo isso com rugas enquanto calcorreávamos a cidade depois do prazer ou do ganha-pão.

Não tardará que em redor do nosso passado só existam pessoas e coisas inofensivas, lamentáveis e desarmadas, só erros que emudeceram.”

 

CÉLINE, Louis-Ferdinand. Viagem ao Fim da Noite. 6ª ed. Lisboa: Ulisseia, 2014.

 

Por: Celeste Sampaio

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