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Alma do Diabo

Alma do Diabo

A Bicha ao poder

20.10.24
Anacoreta, um bicha solitário (em minha defesa, foi o autor que escreveu) que se imiscuiu na floresta, num cenário de pós-qualquer-coisa, foi o terreno onde Manuel Bivar semeou o seu livro A CHARCA. Mais um livro que passou despercebido, talvez porque, nas listas de supermercado criadas para incentivar o comprador a pagar, não existem críticos que sejam verdadeiramente amigos do Manuel Bivar, ou então, a sua editora é pouco pujante em oferendas. Ora, A CHARCA enterra-nos numa (...)

Breves notas sobre a Pátria

21.07.24
JORGE ROQUE passa, quase (ainda existem alguns santuários) complemente despercebido no meio dos culturóides da nação. E percebe-se porque, o homem é um bombista e não um escritor. O recente livro PAÍS RATO rebenta com as letras, destrói a compreensão programada do leitor e torna-o coxo por ter sido apanhado por um obus que existia algures dentro de uma página qualquer do livro. Então, sobre os ditos: “vai ficar tudo bem”, “somos muito bons”, “Portugal é incrível”, (...)

Andreia C. Faria . Odeio e amo

07.01.24
“Odeio este tempo e a forma como os artistas, os opinadores, os decisores, os identitários, os proprietários, os poseurs, os empreendedores se movem nele: com avidez e condescendência, como se alguém, acenando de um qualquer futuro, lhes prestasse já homenagem. Bestas sensíveis, argutas, que para defenderem o seu prazer inundam à terra inteira um terror sofisticado, com disfarce de razão e alegria. Odeio os boçais, os intelectuais, os hedonistas. Os pais que geram filhos num (...)

Fragmento

02.01.24
O meu veneno é a rotina, Corrói as engrenagens do pensamento, Consome a alma em ruína.   Por: Augusto Bessa

Louis-Ferdinand Céline . Tempo e espaço

21.12.23
“Alguns meses modificam um quarto, mesmo que não se mexa em nada do que ele tem dentro. Por velhas, por escavacadas que as coisas estejam, assim mesmo encontram, não se sabe onde, força para envelhecer. Tudo tinha mudado à nossa volta. Não os objectos de lugar, bem entendido, mas as próprias coisas em profundidade. São outras, as coisas, quando as reencontramos, dir-se-á que possuem força para se imprimir em nós mais tristemente, com profundidade ainda maior, com mais (...)

Louis-Ferdinand Céline . O Corpo

19.12.23
“Como não passamos de recintos com tripas mornas e quase apodrecidas, havemos sempre de ter dificuldades com o sentimento. Estarmos apaixonados não é nada, mantermo-nos os dois juntos é que é difícil. A imundície, essa, não procura resistir nem desenvolver-se. Aqui, neste ponto, somos bem mais infelizes do que a merda; no nosso estado, a fúria de preservação constitui uma fortuna incrível. Decididamente, não adoramos nada mais divino do que o nosso cheiro. Toda a nossa (...)

Louis-Ferdinand Céline . O quotidiano

18.12.23
“É triste, as pessoas que se deitam, vemos bem que lhes é indiferente se as coisas correm ou não como elas querem, vemos bem que não tentam compreender o porquê de estarem onde estão. Tanto lhes faz. Dormem de qualquer maneira, são enfatuadas, são broncas, nada susceptíveis, americanas ou não. Tem todas a consciência tranquila. (...) E o pior é pensar como vamos arranjar forças bastantes para continuar a fazer no dia seguinte o que fizemos na véspera e em tantos outros (...)

Alberto Pimenta . Perspectiva sobre a morte

17.12.23
“A morte é uma coisa que pertence à vida, embora muitos pensem que não. A morte digna é uma felicidade a que o homem tem direito. É, ainda, a busca da última felicidade possível para uma vida. A morte digna já não pode ser exatamente como no tempo dos romanos, na banheira, a cortar lentamente as veias, com rosas a boiar na água, rodeado dos amigos e das amigas… mas o que vejo hoje é que a maioria das mortes são indignas: as pessoas são depositadas em lares da terceira (...)

Diabopédia

10.12.23
Fernando Pessoa É um ser que se dedicou à magia negra. Consta que viveu uma vastidão de vidas em corpos diferentes e que, por consequência, também morreu muitas vezes. Uma dessas vezes foi outro escritor macabro que o matou. Conhecido como um louco que nunca foi internado como tal. De tão intelectual até a sua virgindade a perdeu intelectualmente. Só foi dada importância à sua obra postumamente. Quando falamos da sua obra, referimo-nos à sua obra publicitária claro está. É (...)

Alberto Pimenta . As palavras do papagaio

17.09.23
“aprendi a dizer o que aprendi a dizer, diz ele. aprendi a dizer que aprendi o que aprendi a dizer, diz ele. aprendi que não aprendi o que não aprendi a dizer, diz ele. Comecei a dizer o que aprendi a dizer, diz ele de dentro da sua gaiola, aprendi a dizer o que dizem que se pode dizer, diz ele de dentro da sua gaiola, mas como dizem que o que se pode dizer apenas é o que já foi dito, diz ele de dentro da sua gaiola, só aprendi a dizer o que já foi dito,  diz ele, e como não (...)

Raul Brandão - A Vida e o Sonho

31.07.23
A vida é dura, a vida não se fez para sonhar; para triunfar é necessário bater para os lados sem ver quem vem, agarrar-se a gente com sofreguidão, morder... Ai dos vencidos! Pobres dos que hesitam um instante! Auxiliar alguém é perder tempo: prá frente! prá frente!... Fora o sonho! Para que é que em pequenos nos mentem e nos dizem que há amigos e afeições?... Entra a gente na vida com ilusões, que só se perdem com pedaços de alma, quando muito melhor seria dizer-nos que (...)

Marina Tsvetaeva - Depois da Rússia

29.07.23
EURIDICE - PARA ORFEU Para quem esgotou os últimos farraposDa carne (não há lábios nem faces!...)Não será um abuso dos direitosOrfeu descer ao Hades? Para quem rejeitou os últimos elosTerrestres... Quem no leito dos leitosRecusa a mentira da contemplaçãoE olha para dentro - o encontro é faca. Porque - todas as rosas do sangueSão a paga desta capa folgadaDa imortalidade...                           Tu, que me amasteAté ao nascer do Letes, dá-me a paz Da (...)

A indústria do pão por André Schiffrin

29.07.23
Se há coisa que aprecio mais do que livros é de pão. Se me oferecem metáforas com pão para entender o funcionamento do mercado dos livros eu entendo. Foi o que André Schiffrin fez no seu livro O NEGÓCIO DOS LIVROS - COMO OS GRANDES GRUPOS ECONÓMICOS DECIDEM O QUE LEMOS (se calhar foi pelo título longo que isto não vendeu). Que pena, este pequeno livro da LetraLivre ter saído em 2013 e não em 2023, já que, tal como as ervas daninhas saltam em terra fértil, também os temas (...)

Marina Tsvetaeva - Depois da Rússia

28.07.23
OFÉLIA - EM DEFESA DA RAINHA Príncipe Hamlet! Deixa de incomodarOs vermes do jazigo... olha para as rosas!Pensa naquela - que mesmo rosa de um dia -Conta os últimos dias. Príncipe Hamlet! Deixa de denegrirO seio da rainha... Não compete a virgens -Julgar a paixão. Mais culpada é Fedra:Ainda hoje a cantam. E cantarão! - E vens tu, príncipe, com essaMistura de cal e putrefacção... Usas de má-línguaCom os ossos, Hamlet! Não cabe à tua menteJulgar o sangue em chamas. Mas (...)

Edgar Lee Masters – Epitáfios de Spoon River

14.07.23
CHASE HENRY Em vida eu fui o bêbado da vila; quando morri o padre negou-se a enterrar-me em solo sagrado. E isso acabou por ser para mim uma sorte, pois os Protestantes compraram este lote e enterraram aqui o meu corpo, junto à campa de Nicholas, o banqueiro e de Priscilla, a sua mulher. Considerai, ó almas prudentes e piedosas, como a vida, contra a corrente, traz honras funerárias a quem viveu na humilhação.   MASTERS, Edgar Lee. Spoon River (Uma Antologia). Tradução: José (...)

Edgar Lee Masters – Epitáfios de Spoon River

13.07.23
OLLIE MCGEE Vistes caminhar pelas ruas da povoação um homem cabisbaixo e de rosto cadavérico? É o meu marido. Esse que, com secreta crueldade, que nunca revelei, me roubou a juventude e a beleza; até que, por fim, enrugada, com os dentes amarelos, quebrado o meu orgulho, humilhada e submissa, desci a esta cova. E sabeis o que devora o coração de meu marido? O rosto que eu fui, face ao rosto que ele me deu! É isso que o arrasta para o sítio onde estou. Na morte, assim, alcancei (...)

Agustina Bessa-Luís . A infelicidade

10.07.23
“Quando se sofre na idade de ser feliz, nunca mais se acredita na felicidade; nem como acaso, nem como recompensa. Os nossos tormentos tornaram-se num hábito mais querido do que qualquer compensação… - A infelicidade é uma forma de renúncia, não tem nada que ver com a desgraça. É a mais ardente das amantes e por ela sacrificamos tudo: a honra e os amigos, e até Deus.”   BESSA-LUÍS, Agustina. Fanny Owen. 4ª ed. Lisboa: Guimarães Editores, 2002.   Por: Celeste Sampaio

Paul Valery . Amores e ódios, uma explicação

06.07.23
“Por que amo o que amo? Por que odeio o que odeio? Quem não sentiria o desejo de derrubar a mesa dos seus desejos e dos seus ascos? De mudar o sentido dos seus movimentos instintivos? Como é possível que eu seja ao mesmo tempo como um ponteiro magnetizado e como um corpo indiferente?… Contenho um ser menor, a quem tenho de obedecer para não sofrer uma pena desconhecida, que está morto. Amar, odiar ficam abaixo. Amar, odiar - parecem-me acasos.”   VALERY, Paul. O Senhor Teste. (...)

Paul Valery . A verdade de nós próprios

04.07.23
“É impossível recebermos a <verdade> de nós próprios. Quando a sentimos formar-se (é uma impressão) forma-se ao mesmo tempo um outro desusado eu… que nos orgulha… - de quem somos ciosos… (É um pináculo de política interna.)  Entre Eu claro e Eu turvo; entre Eu justo e Eu culpado, há velhos ódios e velhas conciliações, velhas renúncias e velhas súplicas.”   VALERY, Paul. O Senhor Teste. 1ª ed. Lisboa: Relógio d’Água editores, 2018.   Por: Celeste Sampaio